Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência. Em julho, colunistas cedem seus espaços para refletir sobre o papel da ciência na reconstrução do Brasil. Quem escreve é Francilene Garcia, diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Ainda sob o impacto do enfrentamento da maior crise natural de nossa geração, iniciamos 2022 com a esperança de virada rumo à reconstrução. O ano inspira e mobiliza cada um de nós, brasileiros, a contribuir para viabilizar mudanças e avanços de que o país necessita. Convivemos com a pobreza, o racismo, a exploração predatória do nosso patrimônio natural —quem sabe este ano do bicentenário da independência não seja o momento para nos reerguermos e concluir nossa autonomia, mais próximos de uma nação inclusiva, justa, democrática e com futuro.
Uma das lições da pandemia foi ter mostrado ao mundo a importância dos investimentos em ciência. Os imunizantes salvaram a vida de cerca de 1 milhão de brasileiros; no mundo, foram poupados 20 milhões de vidas, segundo estudo do Imperial College de Londres publicado na revista The Lancet.
A pandemia ajudou a acelerar a transformação digital e criou um cenário que continuará a incentivar a inovação e a adoção de novas tecnologias, verdadeiro salto quântico nos processos de gestão e produção e nos hábitos de consumo. Eis um futuro em que o Brasil precisará se inserir.
A despeito das descontinuidades determinadas pelo colapso do sistema de financiamento, a competência científica já instalada entre nós, a infraestrutura de apoio à pesquisa, os ecossistemas de inovação e sua rica diversidade agregam talentos que nos credenciam a trilhar um novo caminho. Enquanto a ciência se apresenta como uma peça-chave nesta reconstrução, a educação é o pilar fundamental para estabelecer uma política de Estado que combata a desigualdade.
No Brasil, o acesso à educação, à ciência, à tecnologia e à inovação é um direito dos cidadãos, conforme estabelece a Constituição Federal. No entanto, apesar de em geral serem bem escritas e proporcionarem avanços para a sociedade, as leis nem sempre são cumpridas, emperrando o funcionamento das políticas públicas e gerando instabilidade nas instituições. Cumprir as leis é um excelente ponto de partida a ser superado nesta virada rumo à reconstrução do país.
É questionável que deputados e senadores, integrantes da Comissão Mista de Orçamento, aprovem sem qualquer discussão o PLN nº 17/2022 que permitirá ao governo federal bloquear os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), infringindo frontalmente a Lei Complementar n° 177, de 2021, conhecida como a Lei do FNDCT, fruto do diálogo entre as várias instituições que compõem o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI).
Com um SNCTI forte e instituições mais aptas a levar a cabo suas missões, com uma política de Estado com governança responsável, transparente e participativa, o Brasil ainda precisa definir áreas estratégicas para investir. O amplo diálogo neste processo de reconstrução é essencial para organizar diretrizes e investimentos que irão mobilizar as competências da comunidade científica em agendas prioritárias para o país.
Esta virada de página não pode prescindir da força da juventude. Precisamos reverter a evasão dos jovens cientistas. Precisamos oferecer educação inclusiva e de qualidade. Os jovens são movidos por sonhos e desafios —é urgente oferecer condições para que todos se sintam estimulados a atuar na construção de um futuro possível.
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