Brasil Coronavírus

Campanha reúne doações para garantir internet a 5 mil alunos de baixa renda que farão Enem

Projeto '4G para estudar' vai dar conexão a estudantes de cursos pré-vestibular que precisam de aulas on-line, por causa da pandemia. Saiba como ajudar!
Campanha '4G para estudar' Foto: Reprodução da web
Campanha '4G para estudar' Foto: Reprodução da web

RIO - O adiamento das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não significou o fim dos problemas para estudantes de baixa renda no país neste período de quarentena . A falta de acesso de qualidade à internet, de um ambiente adequado para o estudo e até de condições alimentares básicas continuam atrapalhando aqueles que sonham com o ensino superior. Pensando nisso, oito cursos pré-vestibulares comunitários, com o apoio do laboratório Nossas, criaram a campanha “4G para estudar”. O objetivo é conseguir internet móvel para ajudar candidatos a se preparar para a prova do Ministério da Educação (MEC).

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A parceria começou com as mobilizações para pressionar o governo a adiar o Enem. Quando foi anunciada a remarcação do exame , o trabalho em conjunto se manteve, pois ficaram evidentes as dificuldades dos alunos com o ensino à distância, necessário num momento em que as aulas presenciais estão suspensas por causa da pandemia de coronavírus.

- O adiamento foi uma vitória, mas, mesmo com a prova adiada, esses estudantes não têm acesso a uma conexão de qualidade e estão perdendo tempo para se preparar. Com o isolamento social, a internet ganhou uma relevância ainda maior, tornando-se uma barreira para o o direito à educação – avalia Daniela Orofino, uma das mobilizadoras do “Nossas”.

As doações podem ser feitas nos valores de R$ 20, R$ 50, R$ 150, R$ 400 e R$ 1.000. Com R$ 20, o doador pode comprar dois chips de celulares para jovens de periferia, e com R$ 1000, garante o acesso à internet de uma turma inteira de pré-vestibular. Saiba como participar

A campanha foi lançada na última terça-feira, dia 9 de junho, com meta inicial de arrecadar R$ 100 mil para ajudar 2256 alunos dos cursos participantes. O valor foi alcançado em menos de 12 horas. Com o sucesso, os organizadores resolveram expandir a meta para mais 5 mil estudantes, de outros cursinhos. No site do projeto, há um formulário para que outros pré-vestibulares se inscrevam na segunda fase da campanha.

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- A adesão massiva da sociedade civil mostra que as pessoas entendem a importância não só da internet, nesse momento, mas da educação. Podemos potencializar o trabalho que os pré-vestibulares comunitários já fazem em seu território – destaca Orofino.

A campanha ainda entrará em contato com empresas de telefonia para a formação de parcerias, como o fornecimento de chips e planos com preços diferenciados.

- Neste ano, 670 mil estudantes pediram isenção da taxa de inscrição no Enem, que custa R$ 85. Se a família não consegue pagar esse valor, imagina arcar com um custo mensal de um plano de internet. Queremos que todos esses estudantes tenham acesso, mas não vamos conseguir sozinhos. Precisamos que as operadoras entrem junto – disse Orofino.

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As doações podem ser pagas por boleto bancário, cartão de crédito e "Pay Pal", nos casos das doações internacionais. O dinheiro será repassado diretamente para a coordenação dos cursinhos. Cada doador receberá uma prestação de contas pelo e-mail cadastrado no momento da doação.

Conexão é um dos obstáculos

Luciana Nunes, 36 anos, é coordenadora de logística do Projeto Rumo à Universidade (PRU), de Recife, um dos oito cursos que participam da primeira fase da campanha. Ela afirma que os problemas já começaram antes mesmo das aulas. Com a pandemia, não foi possível concluir a inscrição de alunos, que é presencial. Das 700 vagas, apenas 100 foram preenchidas. Além da falta de acesso a uma conexão adequada, questões relacionadas à falta de motivação dos alunos e de apoio familiar também dificultam o aprendizado.

- Os alunos alegam falta de motivação, muitos têm crise de ansiedade. O apoio familiar também é difícil, pois os pais não entendem que o aluno precisa se isolar para estudar, que ele necessita ficar no telefone por muitas horas – disse Nunes.

O PRU reuniu os estudantes em grupo de WhatsApp e vem promovendo "lives" nas redes sociais do projeto. Mas a adesão é baixa. Nos aulões de fins de semana, das 14h às 18h30, cerca de metade dos alunos assiste às aulas. O auge foi de 55 estudantes, sendo que, ao final dos encontros, esse número cai para menos de dez, por causa da internet de baixa qualidade.

-  Muitos alunos só conseguem acessar de madrugada, quando a rede fica menos sobrecarregada. Tem professor que fica tirando dúvidas depois da meia noite – comenta a coordenadora.

Situação semelhante é vivida pelo Núcleo Independente e Comunitário de Aprendizagem (Nica), situado no Jacarezinho, na Zona Norte do Rio. O curso, que está no segundo ano de existência, precisou encerrar as atividades presenciais e migrar para o ambiente online. Com a passagem, ocorreram seis desistências de alunos previamente inscritos.

Após tentativas com plataformas como o "Classroom", do Google, e o "Zoom", os coordenadores precisaram alterar a forma de passar os conteúdos. Os alunos reclamavam das quedas de conexão e, rapidamente, tinham os dados de internet móvel do telefone zerados.

-A maioria não tem Wi-fi, então passamos a colocar materiais em PDF nos nossos grupos de WhatsApp. Quem tem acesso pode continuar assistindo às aulas na plataforma, mas apenas seis ou sete alunos conseguem - explica Luan Ribeiro, coordenador do Nica, que conta ainda com a ajuda de um curso pré-vestibular online, que ofereceu códigos para o acesso às aulas sem  consumo de dados, como forma de complementação.

Os coordenadores dos dois projetos ainda fazem a ressalva de que outros problemas também atrapalham o aprendizado, pois muitos alunos ajudam os pais a sustentar a casa. A perda de renda proporcionada pela pandemia fez com que alguns deles não tivessem acesso à alimentação regular. Os organizadores de muitos cursos pelo país realizaram campanhas para arrecadação de cestas básicas para alunos necessitados.

- É difícil convencê-los de que eles podem, sim, entrar para uma boa faculdade. A gente faz todo um trabalho de confiança. Com a pandemia, isso foi quebrado – conta Ribeiro.

Luciana Nunes ficou surpresa com o êxito rápido da campanha.

- Já participei de várias campanhas na minha vida, mas nunca vi algo com esse alcance em tão pouco tempo. Projetos como os pré-vestibulares comunitários existem para pensar no outro. É isso que nos move.