Brasil ainda tem 5,4% que não sabem ler e escrever; qual é o perfil do analfabeto no País

De acordo com novo lebantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a falta de alfabetização na população em geral é de 5,4%

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Por Roberta Jansen
Atualização:

Embora os níveis educacionais do Brasil venham melhorando ano após ano, o País tinha 9,3 milhões de analfabetos em 2023 (5,4% da população) – queda de 0,2 ponto porcentual ante o ano anterior, o que equivale a 232 mil pessoas. O problema revela desigualdades de acordo com a raça e a idade, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNAD)/Educação, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada nesta sexta-feira, 22.

Analfabetismo é maior entre idosos Foto: nooh - stock.adobe.com

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Quanto mais velho o grupo populacional, maior a proporção de analfabetos, mostra o levantamento. Em 2023, eram 5,2 milhões de analfabetos com 60 anos ou mais, o que equivale a uma taxa de analfabetismo de 15,4% para esse grupo etário, quase três vezes mais do que a da população em geral.

“O analfabetismo hoje no Brasil está concentrado entre as pessoas mais idosas”, afirma a pesquisadora Adriana Beriguy, que apresentou os resultados. Os idosos não frequentaram a escola ou tiveram aprendizado muito precário e, por isso, carregam essa condição de analfabetos ao longo da vida. A população mais jovem está muito mais escolarizada.”

No recorte por cor ou raça, revela-se também grande diferença entre as taxas das pessoas brancas e das pretas ou pardas. No ano passado, 3,2% dos brancos eram analfabetos, ante 7,1% para pretos e pardos, mais que o dobro.

Quando os pesquisadores sobrepõem as questões etária e racial, o problema fica ainda mais grave: a taxa de analfabetismo dos brancos de 60 anos ou mais é de 8,6% e entre os negros ela quase triplica, chegando a 22,7%.

Na divisão por gênero, os números são mais parecidos: 5,2% para as mulheres e 5,7% para os homens.

Segundo o Plano Nacional de Educação (PNE), a redução do analfabetismo na população em geral deveria alcançar 6,5% em 2015 e a erradicação total até o fim de 2024. A meta intermediária foi alcançada em 2017.

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A média de anos de estudo das pessoas de 25 anos ou mais, em 2023, foi 9,9 anos. Nos dois últimos anos, essa média ficou estável. Entre as mulheres, a média foi de 10,1 anos de estudo, enquanto para os homens, 9,7.

Com relação à cor ou raça, mais uma vez, a diferença foi considerável, registrando-se 10,8 anos de es- tudo para as pessoas de cor branca e 9,2 anos para as de cor preta ou parda, diferença de 1,6 anos entre esses grupos, que caiu pouco desde 2016, quando era de dois anos.

Entre as crianças de 0 a 3 anos, a taxa de escolarização foi 38,7%, o equivalente a 4,4 milhões de estudantes. Comparado ao ano de 2022, a taxa de escolarização das crianças de 0 a 3 anos apresentou a variação mais expressiva: 2,7 pontos porcentuais; frente a 2016, a expansão foi de 8,4 p.p.

Entre as crianças de 4 a 5 anos, a taxa foi de 92,9% em 2023, e de 91,5% em 2022, totalizando 5,8 milhões de crianças. Já na faixa de 6 a 14 anos, a universalização, desde 2016, já estava praticamente alcançada, mantendo-se em 99,4% das pessoas na escola em 2023, mesmo percentual de 2022.

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A taxa de escolarização entre os jovens de 15 a 17 anos em 2023 foi de 91,9%. Entre as pessoas de 18 a 24 anos e aquelas com 25 anos ou mais, 30,5% e 5,0% estavam frequentando escola, respectivamente.

As pessoas de 18 a 24 anos são aquelas que idealmente estariam frequentando o ensino superior, caso completassem a educação escolar básica na idade adequada.

Contudo, o atraso e a evasão escolar estão presentes tanto no ensino fundamental quanto no médio. Consequentemente, muitos jovens entre 18 e 24 anos já não frequentam mais a escola e alguns ainda frequentam as etapas da educação básica obrigatória.

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Em 2023, a taxa de escolarização das pessoas de 18 a 24 anos, independentemente do curso frequentado, foi de 30,5%, percentual próximo ao registrado em 2022. Por sua vez, 21,6% desses jovens frequentavam graduação e 8,9% estavam atrasados, frequentando algum dos cursos da educação básica. Já 4,3% haviam completado o ensino superior e 65,2% não frequentavam escola.

O levantamento do IBGE mostrou o menor número dos jovens “nem-nem”, que não estudam nem trabalham desde 2019. Na avaliação do instituto, essa tendência se deve mais a uma demanda do mercado de trabalho do que a um retorno desse grupo às salas de aula.

Desigualdades se ‘somam’ ao longo da vida dos negros, diz pesquisador

As vantagens sociais e econômicas para determinados grupos da população e desvantagens para outros são transmitidas de uma geração para outra. Isso afeta de maneira determinante o nível educacional da população negra. Essa é a visão do professor Michael França, do Núcleo de Estudos Raciais do Insper.

“As disparidades vão se somando ao longo do tempo. Se eu sou um indivíduo que tem um patrimônio inicial alto, isso vai afetar as oportunidades que eu vou ter ao longo da vida, oportunidades educacionais, redes de contato. Ao longo do tempo é uma acumulação intergeracional de riqueza”, diz.

“Além disso, a gente tem desigualdade na renda, no patrimônio, são conjuntos de disparidades que vão afetando os resultados ao longo da vida do indivíduo. No caso dos negros, você também tem mecanismos discriminatórios. Nesse contexto, a tendência é que o negro fique para trás”, completa.

Após dois anos de estudo, França, ao lado do pesquisador Alysson Portella, produziu respostas sobre o tamanho da desigualdade racial no País no livro Os números da discriminação racial (Editora Jandaíra).

A desigualdade entre brancos e negros tem origem no Brasil de século atrás, quando ainda havia a escravidão, e são visíveis ainda hoje. Os efeitos estruturais dessa discriminação resultam em piores salários, menos educação e saúde para a população negra.

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“Existem vários fatores que vão afetar o nível educacional, como a própria educação dos pais. Apesar da convergência nos anos de escolaridade que está ocorrendo entre brancos e negros ao longo do tempo, negros ainda têm um nível de escolaridade relativamente menor”.

França observa a falha das políticas públicas na redução de desigualdades históricas. “As políticas públicas, que deveriam ser uma forma de equalizar as oportunidades e diminuir essas disparidades históricas, falham. Não raramente falta investimento em educação para os lugares mais periféricos”.

* Este conteúdo foi produzido em parceria com o Núcleo de Estudos Raciais do Insper.

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