Na última quarta-feira (9), a Câmara dos Deputados aprovou o relatório da deputada Dandara (PT-SP) que modifica a chamada Lei de Cotas no Ensino Superior (12.711/2012). Apesar do saldo positivo, apontado por várias pesquisas, a legislação apresentava problemas pontuais.
Vale lembrar que a política federal de cotas brasileira foca mais grupos em desvantagem econômica do que raciais. Metade das vagas de cada curso é reservada para estudantes de escolas públicas e, metade disso (portanto, 25% do total), para estudantes de baixa renda. As cotas para pretos, pardos e indígenas, bem como as cotas para pessoas com deficiência, incidem sobre essas cotas sociais maiores.
Uma das principais mudanças é a alteração do critério de baixa renda. Na lei atual, podem se beneficiar estudantes oriundos de famílias com renda inferior ou igual a 1,5 salário mínimo per capita (ou R$ 1.980). Isso quer dizer que uma família hipotética com cinco membros que tenha renda total de R$ 9.800 era considerada de baixa renda, o que englobava a imensa maioria dos estudantes do ensino médio público. Como estes concorrem apenas entre si, os estudantes menos pobres dentre os pobres acabavam ocupando a maior parte dessa cota. A nova redação reduz o limite para um salário mínimo per capita (R$ 1.320), teto mais adequado à realidade social brasileira. Vale lembrar que estudantes que ganham mais permanecem acessando as cotas de escola pública, independentemente da renda.
Outra mudança é que candidatos cotistas passam a competir primeiro com os da ampla concorrência. Estudos recentes mostraram que alguns cotistas tinham notas de entrada superiores às de não cotistas em cerca de 25% das graduações no Sisu. Embora tivessem um desempenho superior aos estudantes da ampla concorrência, esses só podiam concorrer dentro de suas cotas. A mudança visa a corrigir distorções como esta, fazendo com que as cotas continuem funcionando como piso e não como teto.
Além disso, quilombolas são incluídos no rol de beneficiários e recomenda-se às universidades que estabeleçam ações afirmativas nos programas de pós-graduação.
Mas talvez a principal mudança seja aquela sobre a revisão da política. A redação vigente previa a revisão da lei em 2022, o que não aconteceu. Como ela não falava em nenhum prazo de validade, a lei continua vigendo até hoje. No entanto, isso criou um cenário de insegurança jurídica.
A nova lei torna a política permanente, contudo obriga o governo a fazer avaliações a cada dez anos. Mais importante ainda, ela obriga os ministérios envolvidos a sistematizar e disponibilizar os dados necessários para tal, uma demanda antiga da academia e dos movimentos sociais.
Enquanto outros países vêm retrocedendo em suas ações afirmativas, a exemplo dos Estados Unidos, a mudança na Lei de Cotas dá um passo para sua consolidação e aprimoramento. O projeto ainda será discutido no Senado.
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