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Opinião

Artigo: O intangível valor de um professor

Dizer a um estudante, em qualquer fase da vida, que ele é capaz de se superar tem um poder libertador

Helena tinha 7 anos e se lembra até hoje o que ouviu de sua primeira professora num dia difícil. À época, ela ainda não sabia que aquelas palavras a seguiriam, mudariam sua trajetória, estimulariam seu talento e definiriam suas escolhas. A excessiva timidez, traduzida em pânico, que a impedia de ler em público e expressar suas opiniões em sala de aula virou passado com o apoio da professora que dela não desistiu. Helena se alfabetizou, seguiu, cresceu, enfrentou e venceu muito mais que a sala de aula de sua infância. É possível que, sozinha, Helena não tivesse vencido a timidez e tido sua história de sucesso. Helena existe, mas ela é apenas um dos muitos exemplos de como um bom professor transforma vidas. Essa delicada relação é o maior dos seus encantos e também um enorme desafio.

Dizer a um estudante, em qualquer fase da vida, que ele é capaz de se superar tem um poder libertador. Por mais que se meça — e sim, há pesquisas importantes sobre o que é ser um professor — é um desafio quantificar o real impacto de um professor na vida de um indivíduo. O real valor está nos detalhes da relação de confiança entre eles.

Naquele caso, a professora unia sua sensibilidade com a preparação e a qualificação necessárias para exercer sua função primeira, que era alfabetizar Helena. Ela era preparada do ponto de vista pedagógico e sabia o que e como fazer. No entanto, nem sempre é assim. Os caminhos, muitas vezes, são tortuosos e os desafios podem parecer intransponíveis. As adversidades enfrentadas pelos professores são muitas. Faltam estrutura e equipamentos nas escolas, o Estado falha na proteção de crianças e adolescentes, e professores se deparam com situações para as quais não estão preparados. Uma delas é a violência, da qual são vítimas ou testemunhas. As condições em que os professores exercem seu trabalho atualmente são inadequadas, em vários sentidos. Ao mesmo tempo, é ele o maior propulsor da qualidade do ensino.

Professoras como a de Helena devem ser formadas com incentivos concretos, remuneração compatível com a responsabilidade, planos de carreira, perspectivas, condições de trabalho e adequada formação, em particular a inicial. A valorização do professor não pode estar no campo da retórica e restrita aos debates teóricos. O fato é que o país ainda se perde buscando alternativas enquanto os diagnósticos estão feitos. Parece, às vezes, que não caminhar é o caminho escolhido. E esse é o maior risco.

Todo mundo tem na memória um bom professor que foi decisivo. Há formas concretas de avaliar a educação, e medidas tangíveis sobre a capacidade de aprender e ensinar. Em paralelo, há também o intangível, o subjetivo. E como medir esse valor na vida transformada de Helena? Quanto existe da primeira professora nas vitórias que ela acumulou ao longo da vida? Educação é tema inesgotável. Mas, no Dia do Professor, é bom pensar, especialmente, no imensurável valor que ele tem, na sua capacidade de transformar as vidas que escreverão a história futura do Brasil.

Juliana Leitão é especialista em políticas educacionais da Fundação Roberto Marinho