Por Filippo Mancuso, SP1 — São Paulo


Aprovação automática nas escolas municipais divide opinião de pais e especialistas

Aprovação automática nas escolas municipais divide opinião de pais e especialistas

A aprovação automática de estudantes da rede estadual e municipal de ensino divide opiniões entre pais e especialistas. A volta às aulas presenciais foi remarcada para o dia 7 de outubro e a Câmara Municipal aprovou o plano da Prefeitura com regras para essa retomada na capital.

A aprovação automática já existe no sistema público de ensino estadual e municipal, com exceção do terceiro ano do Ensino Médio e no sexto do Ensino Fundamental, que há reprovação.

Desde que começou a pandemia, os livros têm sido os únicos companheiros de estudo da Emelly Camargo, de 13 anos.

“Eu leio tudo até eu entender”, afirma ela.

Emelly é aluna do oitavo ano do Ensino Fundamental na Escola Municipal Flores da Cunha, em Sapopemba, na Zona Leste.

Mas por causa do sinal de internet ruim em casa, ela tem dificuldade de acessar o aplicativo de celular que a prefeitura disponibilizou além das apostilas com o conteúdo do programa de ensino à distância.

“Eu sinto mais falta da explicação dos professores, deles explicando todas as matérias, eu tirando minhas dúvidas com eles e tudo mais”, afirma.

Por esses motivos a mãe dela, Debora Alves, acha que a filha não tem condições de passar para o nono ano.

"Porque ela não teve experiência nem ajuda nem nada. Ela mesmo fala ‘eu não quero ir pro nono. Se eu tiver que ir pro nono, eu peço que atrase um ano pra mim poder continuar no oitavo’.”

A pedagoga e doutora em psicologia da educação Anna Helena Altenfelder concorda com a aprovação automática.

Para ela, a reprovação em um ano como esse agravaria a desigualdade entre os alunos e a evasão escolar.

“Significaria aprovar aqueles que tiveram oportunidade de acesso, de equipamento, de famílias que podiam fazer a mediação - ou seja, podiam apoiar e ajudar os alunos nas suas tarefas, que moravam em casas, em espaços que podiam ser organizados pra isso - e reprovaremos aqueles que não tiveram as mesmíssimas condições”, afirma.

O risco da evasão é grande e a gente sabe que a reprovação é uma das causas da evasão, mas a educadora defende que, para funcionar como instrumento pedagógico, a aprovação automática precisa ser sucedida de um plano de reposição do conteúdo perdido.

“Não de um ano, mas, talvez, de dois ou até três anos. Vai precisar reorganizar o currículo, reorganizar a gestão da escola, da sala de aulas, porque nós vamos lidar com uma situação bastante heterogênea. O que eu quero dizer? A salas de aula vão ter alunos em diferentes níveis de aprendizagem e o trabalho pedagógico vai precisar atender a essa realidade.”

A Prefeitura diz que já tem medidas em implantação e que, antes de qualquer coisa, assim que as aulas voltarem, vai aplicar uma prova para ver o que os alunos aprenderam com o ensino à distância.

“A partir do resultado dessa prova, nós vamos calibrar um grande programa de reforço, recuperação e reposição de aulas, que vai durar esse ano, o tempo que a gente puder fazer aulas presenciais, e todo o ano que vem”, afirmou o secretário municipal de educação Bruno Caetano.

Anna Helena, que também é diretora executiva do entro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), diz que a reprovação não é eficaz.

“Na verdade, a questão da reprovação, já há muitos anos, tem sido estudada, pesquisada, e as evidências mostram que a reprovação, ela não é uma ferramenta pedagógica eficaz. O que isso que dizer? Que repetir de ano não ajuda a aprender mais.”

Por outro lado, também existem muitos estudos que mostram o custo financeiro pro sistema de ensino - é um alto custo financeiro - e um custo social, psicológico, emocional para os alunos. Portanto a reprovação não é eficiente.

“Em uma situação como nós estamos vivendo hoje, reprovar ou aprovar significaria aprovar aqueles que tiveram oportunidade de acesso, de equipamento, de famílias que podiam fazer a mediação - ou seja, podiam apoiar e ajudar os alunos nas suas tarefas, que moravam em casa e espaços que podiam ser organizados pra isso - e reprovaremos aqueles que não tiveram as mesmíssimas condições, não é? Então nós não estaríamos aprovando ou reprovando a aprendizagem, nós estaríamos aprovando ou reprovando condições socioeconômicas culturais, o que não é justo e o que não é desejável num país que vê a educação como uma possibilidade, uma oportunidade de desenvolvimento pessoal e social.”

Por outro lado, de acordo com a especialista, aprovar apenas é inócuo porque se aprovar os alunos e, depois, não se desenvolver estratégias, seja na sala de aula, na escola e nas secretarias para recuperar a aprendizagem desse alunos, os alunos com menores condições também estarão sendo penalizados.

“Aprovar não significa abandonar os alunos à própria sorte. Aprovar não significa dizer que eles estão aptos a cursar o próximo ano letivo.

Vai precisar reorganizar o currículo, reorganizar a gestão da escola, da sala de aulas, porque nós vamos lidar com uma situação bastante heterogênea. As salas de aula terão alunos em diferentes níveis de aprendizagem e o trabalho pedagógico vai precisar atender a essa realidade”, afirma.

O plano de volta às aulas presenciais na capital também prevê que, enquando durar a pandemia, os pais podem escolher se mandam os filhos pra escola ou continuam com o ensino à distância.

O secretário Bruno Caetano antecipou ao SP1 que a prefeitura começou a instalar computadores com internet rápida e projetores nas escolas. A previsão é ter isso em metade das 12 mil salas de aula até a data da retomada, que ainda vai ser definida.

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