Antônio Gois
PUBLICIDADE
Antônio Gois

Um espaço para debater educação

Informações da coluna

Antônio Gois

Jornalista de educação desde 1996. Autor dos livros 'O Ponto a Que Chegamos'; 'Quatro Décadas de Gestão Educacional no Brasil' e 'Líderes na Escola'.

Por Antônio Gois


Entre vários retrocessos debatidos no campo educacional, um deles é menos visível, mas também gera prejuízos graves ao setor: o atraso ou a dificuldade de acesso a dados fundamentais para o melhor diagnóstico e desenho de políticas públicas. São vários os motivos que nos levaram a essa situação. Um deles está na maior dificuldade de acesso aos microdados, arquivos utilizados por pesquisadores e jornalistas que permitem o cruzamento de múltiplas variáveis coletadas nas bases de dados do Inep, autarquia responsável pelas avaliações e estatísticas oficiais da educação. O órgão se baseou numa interpretação considerada por muitos especialistas demasiadamente restritiva da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) para diminuir o acesso a essas bases.

Num momento tão propício – em condições normais de temperatura e pressão política – ao debate de soluções para o país devido às eleições, nossa capacidade de análise e de entendimento da complexidade dos problemas educacionais fica comprometida. Apenas para citar um exemplo, a editora Moderna e o movimento Todos Pela Educação anunciaram recentemente que o Anuário Brasileiro da Educação Básica, que era publicado desde 2012 e trazia sempre um importante retrato da situação do setor, não será publicado neste ano, por falta de dados. Grupos de pesquisas e outras organizações da sociedade civil têm relatado problemas similares: estão deixando de atualizar suas séries históricas por causa da restrição aos dados.

A LGPD não é a única explicação. A pandemia também afetou séries históricas importantes. Por exemplo, o próprio Inep, ao divulgar em junho seu relatório de monitoramento das metas do Plano Nacional de Educação, deixou de trazer informações relevantes em alguns indicadores porque diversos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE, não estavam disponíveis.

Por fim, há também o problema do descaso e da falta de prioridade com os organismos que trabalham com as estatísticas públicas. Antes mesmo da pandemia, o governo Bolsonaro e o Congresso Nacional negaram ao IBGE o orçamento necessário para a realização do Censo Demográfico, que deveria ter sido realizado em 2020. O censo é o único levantamento capaz de trazer informações detalhadas, para cada município e setores censitários (que podem ser distritos, bairros ou microrregiões), de informações como o número total de crianças de determinada faixa etária ou de adultos analfabetos.

Supondo um mundo ideal, em que as decisões de políticas públicas são tomadas apenas por critérios técnicos (sabemos, basta lembrar do caso dos pastores do MEC, que isso nem sempre acontece), a ausência dessas informações dificulta o desenho de políticas públicas mais focalizadas na população que mais necessita.

Voltando ao Inep, temos ainda os problemas conhecidos de alta rotatividade na presidência e em cargos estratégicos do órgão. Ao menos nessa seara podemos registrar uma boa notícia: Carlos Moreno, anunciado na semana passada como o sexto presidente do Inep desde o início do governo Bolsonaro, é um servidor experiente com profundo conhecimento de sua área. É um sinal dos tempos que algo que deveria ser trivial – a nomeação de uma pessoa tecnicamente qualificada – seja mais exceção do que regra.

Mais recente Próxima