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A educação que vale a pena

200 anos para ter todos os jovens no Ensino Médio

A evasão e o abandono escolar atingiram números alarmantes com a pandemia e precisamos agir já para evitar que mais jovens larguem os estudos antes do tempo em nosso país

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Por Ana Maria Diniz
Atualização:

Como era de se esperar, a conta pela decisão de reabrir bares e lojas antes das escolas no país durante a pandemia está saindo cara. E parte dela já está sendo cobrada: regredimos duas décadas em termos de evasão e abandono escolar no país, revelou a Unesco esta semana. Antes da crise do Covid-19, 1,3 milhão de crianças e adolescentes em idade escolar estavam fora das salas de aula. Ao longo de 2020, outros 4 milhões se desvincularam dos estudos e podem nunca mais retornar.

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A evasão e o abandono escolar constituem uma tragédia individual e coletiva. O adolescente que não termina o Ensino Médio ganha de 20% a 25% menos do os que se formaram, tem menos chances de conseguir um emprego formal, vive em média quatro anos menos e corre um sério risco de entrar para o crime. Em um sentido mais amplo, prejudica a formação do capital humano e coloca obstáculos enormes ao progresso do país.

Florence Bauer, representante da Unicef no Brasil, reforçou que para evitar a evasão a educação precisa realmente ser entendida como uma coisa prioritária no Brasil. Nesse sentido, foi muito bem vinda a atitude do governo de São Paulo de decretar a educação como um serviço essencial no estado. Também torço para que a proposta das deputadas Adriana Ventura (Novo-SP), Paula Belmonte (Cidadania-DF) e Aline Sleutjes (PSL-PR) para colocar a educação entre os serviços essenciais na quarentena, em tramitação na Câmara dos Deputados, seja rapidamente aprovada.

Mas somente essas medidas não são suficientes. Além de legislar para fazer da educação de fato uma prioridade, o momento exige ações em outras frentes. Uma delas é identificar e buscar os alunos que abandonaram ou estão prestes a abandonar a escola, não importa onde eles estejam. Essas crianças e jovens podem nunca mais voltar a uma sala de aula se ninguém se preocupar de verdade com eles. Não podemos deixar esses estudantes para trás!

Diante do cenário atual, as estratégias de busca ativa, que identificam alunos evadidos ou em risco de evadir para recuperá-los, ganham ainda mais importância. Desde o ano passado, projetos promissores com essa finalidade vêm sendo executados em 19 estados do país. Cada rede de ensino adotou estratégias próprias para alcançar os estudantes, levando em conta as peculiaridades de cada região. Por exemplo:

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- No Maranhão, os gestores focaram no monitoramento dos estudantes e no contato com as famílias. Eles observam se o aluno acessa o Google Meet, a plataforma Zoom e se está na sala virtual. Para os que não têm acesso à internet, os educadores controlam o engajamento durante a distribuição do material didático. O programa também vai atrás dos alunos que vivem em lugares de difícil acesso, para verificar se houve abandono e levar conteúdo para os que ainda estão matriculados. Só no ano passado, 6 mil alunos evadidos foram rematriculados por conta dessas ações.

- Em São Paulo, a estratégia envolveu o desenvolvimento de um algoritmo capaz de identificar os alunos com maior risco de evasão. A partir dos dados de cada estudante, como frequência escolar, o algoritmo lista as crianças e adolescentes em risco.Essa listagem é distribuída para as escolas, para que elas possam monitorá-los com mais atenção. Ao identificar os alunos que não estão acompanhando as atividades remotas, a equipe escolar realiza um primeiro contato virtual, seguido de uma visita em domicílio caso o aluno não responda.

- No Paraná, a ação foi direcionada para a conscientização das famílias sobre a importância de manter o vínculo entre os estudantes e a escola durante a paralisação das atividades presenciais. No município de Ibaiti, por exemplo, área de plantação de cana-de-açúcar, a maior parte das famílias reside em locais afastados do centro. Dos 300 estudantes matriculados na escola, 100 residem em sítios e assentamentos, o que demandou uma abordagem com a ajuda de carros de som e visitas residenciais.

A sociedade civil também está se mobilizando. Dentro de um mês, será lançado o Mentorare, uma iniciativa do Instituto Fefig com a Fundação Iochpe para combater a evasão e aumentar o engajamento dos alunos no Ensino Médio. O projeto focará em três frentes principais:

  • busca dos alunos que evadiram e acompanhamento dos que estão prestes a evadir;
  • reengajamento com a escola a partir de um programa de mentoria para ajudar o estudante a encontrar um sentido na educação e um caminho a seguir na vida profissional;
  • apoio financeiro, por meio de um cartão pré-pago, atrelado à frequência escolar para garantir as necessidades básicas das famílias e evitar que o jovem largue os estudos para ajudar nas despesas.

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Dos 50 milhões de jovens brasileiros de 14 a 29 anos, 10,1 milhões (20,2%) não completaram a educação básica, segundo a última Pnad Contínua. Nossas taxas de frequência escolar no ensino médio estão praticamente estagnadas há 15 anos. Se continuarmos nesse ritmo, serão necessários 200 anos até conseguirmos ter 100% dos nossos jovens no ensino médio.

É impossível para qualquer pessoa que se preocupa com o futuro do país assistir essa tragédia anunciada passivamente. Quanto mais tempo as crianças ficarem fora da escola, menor é a probabilidade de elas retornarem. Precisamos nos mexer e o momento para agir é já!

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