Rio

Alunos do Colégio São Vicente fazem protesto por demissões de professores

Estudantes também reclamam contra o fim das aulas para jovens e adultos
Grupo de alunos durante protesto na porta do colégio, no Cosme Velho Foto: Célia Costa
Grupo de alunos durante protesto na porta do colégio, no Cosme Velho Foto: Célia Costa

RIO - Trinta e seis anos depois da vigília, em que estudantes passaram um mês acampados no Colégio São Vicente, em protesto contra uma demissão em massa de professores, a escola no Cosme Velho, uma das mais tradicionais da cidade, vive hoje cenas parecidas. Um novo afastamento de funcionários — alguns deles com mais de duas décadas na instituição — levou um grupo de alunos a fazer duas manifestações, a última delas ontem à tarde, diante dos portões do “São Viça”, como o espaço é carinhosamente chamado.

Os jovens reivindicam a reintegração de 11 profissionais, entre eles professores, e também que a direção não dê fim às turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA), previstas para acabarem daqui a dois anos. Eles também lutam para que o colégio, conhecido por ser um espaço progressista, que tem como lema formar “agentes de transformação social”, não mude seus rumos.

— O São Vicente sempre foi uma escola onde havia liberdade política. Podíamos até afixar faixas de protesto no colégio. Nos últimos anos, no entanto, percebemos uma perda disso. Até que tudo culminou com as demissões e o fim da EJA — lamentou o estudante Artur Almeida, que acaba de concluir o ensino médio e estava ontem no protesto no Cosme Velho.

No centro da polêmica sobre a suposta guinada do colégio para uma educação mais tradicional, está, além da perda de liberdade de que se queixam os alunos, um artigo postado no site da escola por um dos coordenadores. O trecho que tem deixado pais e estudantes em polvorosa diz que “diante de uma Revolução Industrial que muda a forma como as pessoas se relacionam com o trabalho e altera a maneira como interagem entre si, com as máquinas, com fornecedores, com clientes, as instituições de ensino, necessariamente, terão de se adequar”.

Para alunos e pais, que têm trocado mensagens diárias em grupos de WhatsApp, o texto mostraria que a escola estaria tentando “se adequar a um modelo empresarial de educação”, contrariando a proposta do colégio. Após uma reunião de cerca de 75 pessoas com a direção, na última quarta-feira, o texto foi retirado do site.

A movimentação dos jovens , que criaram uma página no Instagram, arregimentando 550 seguidores em poucas horas, vem ganhando repercussão e apoio. Ontem, o ex-deputado federal Chico Alencar foi à porta do São Vicente conversar com os estudantes. Professor de história do colégio no começo da década de 1980, ele saiu da escola em solidariedade aos demitidos em 1983. E ressaltou a importância da mobilização atual.

—Vocês (os alunos) são exemplo para todos nós. Vir, durante as férias, para lutar pela educação de jovens e adultos é motivo de orgulho — disse.

Em 1983, demissão em massa de profissionais levou alunos a uma vigília, com acampamento na escola Foto: Terceiro / Agência O Globo
Em 1983, demissão em massa de profissionais levou alunos a uma vigília, com acampamento na escola Foto: Terceiro / Agência O Globo

O movimento recebeu apoio de famosos, como sociólogo Jessé Souza. Luiz Eduardo Soares, antropólogo e especialista em segurança pública, que tem um neto que estuda no colégio, lamentou, em um vídeo nas redes sociais, a perda da liberdade.

Em nota enviada aos pais, o colégio disse que os desligamentos afetaram “5% do total do quadro de 205 educadores”. Em reunião com os pais, a direção do São Vicente afirmou que as demissões não seriam revistas, com exceção do caso de dois profissionais, que estariam às vésperas da aposentadoria. Em relação ao fim do EJA, a escola manteve a sua posição, mas disse que daria início a outro projeto social, com crianças, na Baixada Fluminense. Procurada pelo GLOBO, a direção do Colégio São Vicente ainda não se pronunciou. Informaram que seria realizada uma reunião no fim da tarde desta sexta-feira e, somente após isso, divulgariam uma nota.

A Associação de Pais e Mestres (APM) soltou comunicado nesta sexta-feira em que ressaltam que "a direção da escola permanece em diálogo com a associação e com outros membros da comunidade vicentina, o que expressa a importância desse espaço de diálogo como princípio fundamental do projeto do CSVP".

Há três anos, alunas fizeram "sutiãzaço" como protesto

Engajados, os alunos já tinham entrado em rota de colisão com o colégio há três anos. Inconformadas com o fato de uma estudante do ensino médio ter sido levada à coordenação por ir à aula sem sutiã, alunas resolveram fazer um “sutiãzaço” dentro da escola. As meninas, todas a partir do 9º ano do ensino fundamental, e lideradas pelo Coletivo Femininja, criado na própria instituição, retiraram as peças e penduraram num varal, improvisado no meio do pátio.

“Demos um toque porque ela estava vindo com blusas transparentes e isso incomodou alguns alunos e profissionais. Não temos um código de vestimenta para o ensino médio para que os estudantes se manifestem de forma livre, mas temos que zelar por eles. Foi pela segurança dela, que está exposta na rua, não só dentro do colégio”, afirmou à época Laura Régent, então coordenadora comunitária.