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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Além do prazo: reflexões sobre a potência do Plano Nacional de Educação

Sala de aula - Alyne Pinheiro/Secretaria de Educação de Pernambuco
Sala de aula Imagem: Alyne Pinheiro/Secretaria de Educação de Pernambuco

Patricia Mota*

26/06/2023 06h00

Na reta final da vigência do atual PNE (Plano Nacional de Educação), prevista para 26 de junho de 2024, não basta apontar os reveses. É preciso evidenciar todas as oportunidades oferecidas a partir da aprovação da lei, que estabeleceu um conjunto de 20 metas a serem alcançadas de forma gradual ao longo dos seus dez anos de vigência (de 2014 a 2024).

Entre os objetivos estão a universalização da oferta da etapa obrigatória (4 a 17 anos), a elevação da taxa de alfabetização, a valorização dos profissionais da educação, a redução das desigualdades sociais e a ampliação dos investimentos. Há muito que o PNE pode nos ensinar e inspirar.

Em um país cujo arranjo federativo gera tanta complexidade para a gestão educacional, o documento aponta convergências e prioridades que se mantêm ainda mais relevantes após atravessarmos o contexto da pandemia. E essas convergências foram fruto de intensos debates em fóruns municipais, estaduais e nacionais, envolvendo os mais diversos setores da sociedade em interlocução com o poder público.

Nesse sentido, se todo país precisa de um grande pacto em prol da garantia do direito à educação, temos que celebrar o PNE como um instrumento potente nessa direção. Tem um significado profundamente republicano e democrático, a ser preservado, começando pelo exercício de monitoramento do cumprimento de cada uma de suas metas.

Algumas delas ainda aguardam uma chance para se concretizarem. É o caso da meta de instituição do SNE (Sistema Nacional de Educação), que, atualmente, aguarda votação na Câmara dos Deputados. Com o SNE, a expectativa é de que exista mais colaboração, articulação e consenso entre as iniciativas dos três níveis de governo e entre as redes de ensino, impactando positivamente a qualidade do ensino e da aprendizagem.

A implementação do Sistema pode ainda contribuir para a universalização do acesso, equalização de oportunidades, otimização dos recursos financeiros, valorização dos profissionais, entre outros pontos.

Se olharmos para as etapas de transição, ou seja, os dois últimos anos da Educação Infantil (crianças de 4 e 5 anos) e os anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano), constatamos tanto atrasos quanto avanços nas metas. Porém, o que importa, de fato, é entender o status de cada uma delas como subsídios para avaliação e planejamento de novas estratégias que deem continuidade ao enfrentamento dos desafios que não foram superados nos últimos nove anos.

Na Meta 1, que previa a universalização da Educação Infantil na pré-escola até 2016, a taxa de cobertura nessa faixa etária saltou de 89,1%, em 2014, para 94,1%, conforme o Relatório do 4º Ciclo de Monitoramento do Plano Nacional de Educação 2022, apresentado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Portanto, a partir dessa fonte, sabemos que para se atingir essa meta seria necessária a inclusão de cerca de 300 mil crianças de 4 a 5 anos na Educação Infantil.

É urgente haver políticas e recursos para os municípios atenderem prioritariamente os pequenos que vivem em famílias com rendas mais baixas, em virtude da maior demanda nesse grupo, conforme apontado no relatório. Mas, para além da cobertura, a qualidade das práticas pedagógicas precisa ainda melhorar radicalmente em muitas redes, creches e pré-escolas - lembrando que se trata de uma etapa estratégica para que a criança chegue mais bem preparada para o início da alfabetização.

Para os anos finais do Ensino Fundamental, contemplados na Meta 7, que preconiza o aprendizado adequado na idade certa, o objetivo era melhorar o fluxo escolar e da aprendizagem de modo a atingir a média nacional de 5,2 no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) em 2019. O resultado chegou a 4,9.

Mais que o não atingimento, essa informação nos mobiliza a refletir sobre o que foi feito em termos de políticas ou programas específicos para a etapa do sexto ao nono ano, o início das adolescências. Rapidamente, concluímos que de forma geral não tivemos políticas ou programas específicos para essa etapa no país.

E os próprios indicadores disponíveis nos mostram que é justamente nos anos finais do Fundamental quando a performance e os níveis de permanência e de aprovação mais caem, alargando as desigualdades por raça/cor e nível socioeconômico antes mesmo que os adolescentes consigam sequer chegar ao primeiro ano do Ensino Médio.

Nesse olhar para o horizonte, há conquistas adicionais a serem comemoradas, como a recomposição do Fórum Nacional de Educação (FNE), espaço essencial de interlocução entre sociedade civil e o Estado brasileiro. O Fórum é resultado da Conferência Nacional de Educação (Conae) de 2010 e instituído por lei com a aprovação do PNE. Em março deste ano, o Ministério da Educação efetivou a recomposição do Fórum, oportunizando, entre outras medidas, que organizações historicamente ligadas à defesa do direito à educação articulem os fóruns estaduais.

Portanto, temos aprendizados consolidados para nos apoiar na virada desse jogo contra o retrocesso e as desigualdades, no sentido de recuperar uma agenda que avance em termos de acesso, qualidade e permanência na educação. E a mobilização ampla e irrestrita não precisa acontecer só na construção, discussão e aprovação de um novo Plano.

Uma vez aprovado um novo PNE, é fundamental manter aquecido o engajamento do máximo possível de atores, o olhar constante sobre cada uma das metas e a participação ativa dos gestores públicos e da sociedade civil no acompanhamento e na valorização do PNE.

Para além do acompanhamento técnico feito pelo resiliente trabalho dos funcionários públicos do Inep, o Plano Nacional de Educação precisa estar continuamente no debate público, como uma âncora que atravessa diferentes ciclos eleitorais e nos permite vislumbrar horizontes ambiciosos e necessários para a educação no nosso país.

*Patricia Mota Guedes é superintendente do Itaú Social

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