Descrição de chapéu Voluntariado na Educação

Ajudar outro estudante no futuro é 'preço' de bolsa no Instituto Semear

Expectativa é que universitários apoiados colaborem com o projeto após graduação

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São Paulo

Vinda do ensino público e primeira da família a cursar uma graduação, Paloma Flores, 24, se formou no ano passado em relações internacionais pela Universidade Federal do ABC (UFABC). Entrar na faculdade foi um sonho que ela conseguiu realizar graças ao projeto de bolsas do Instituto Semear, organização sem fins lucrativos que oferece apoio a universitários de baixa renda.

Aprovada no vestibular, seu primeiro desafio foi a moradia. Ela não tinha como custear a mudança de São José dos Campos (a 92 km da capital paulista), onde morava, ou o transporte diário até a universidade, que fica em Santo André (Grande São Paulo). A bolsa permitiu que frequentasse as aulas enquanto aguardava a aprovação de outros benefícios, como o auxílio alimentação da universidade.

 Lucas Moraes, 21, que foi bolsista e hoje é diretor no Instituto Semear, rganização sem fins lucrativos que oferece suporte a estudantes universitários de baixa renda.
Lucas Moraes, 21, que foi bolsista e hoje é diretor no Instituto Semear, rganização sem fins lucrativos que oferece suporte a estudantes universitários de baixa renda. - Bruno Santos/Folhapress

"A educação é a chave para você conseguir ter sonhos maiores. Eu não imaginava que sairia da minha cidade e conseguiria chegar até a ONU para falar do que amo, que é a mudança pela educação", conta, referindo-se a 2018, quando foi uma das representantes do Brasil na Assembleia da Juventude da ONU, em Nova York (EUA). A viagem foi possível graças a uma campanha de financiamento coletivo que teve o apoio do Semear.

Pode-se dizer que a jovem-semente, como são chamados os bolsistas do Semear, frutificou —Paloma é hoje coordenadora de projetos no Instituto Ismart, entidade sem fins lucrativos que concede bolsas a alunos do ensino básico.

É a realização dos desígnios do Semear. "Em troca da bolsa, queremos que o estudante assuma o compromisso de, no futuro, ajudar na educação de outro jovem. Queremos fazer com que sejam multiplicadores", diz Lucas Moraes, 21, aluno do quarto ano de engenharia mecatrônica na Escola Politécnica da USP e atual diretor-executivo do instituto.

O Semear nasceu em 2010, quando dois estudantes do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) se uniram para arrecadar doações e ajudar jovens de baixa renda que chegavam à universidade.

Também o primeiro da família a entrar na universidade, Lucas foi semente em 2018, quando ingressou na graduação. Em quatro anos de Semear, foi voluntário, estagiário e coordenador, até chegar à direção, neste ano.

"Existe uma pressão para que o jovem comece a trabalhar e possa contribuir em casa. Já estudar é uma promessa de futuro, e o desafio para o estudante de baixa renda é arcar com alimentação, transporte e, no caso de cursos em tempo integral, não poder conciliar com um emprego."

Desde a fundação, a organização atendeu 420 jovens-sementes. As bolsas, de R$ 360 por mês, são financiadas por doações de pessoas físicas e empresas. A organização contempla cerca de 50 bolsistas por ano. Em 2021, o número aumentou para cem, e o objetivo para o ano que vem é chegar a 200 estudantes.

O instituto está estruturado em um tripé básico: gestores, que cuidam da administração, captam recursos e gerenciam as bolsas; estudantes voluntários, que organizam encontros entre jovens-sementes e mentores voluntários, e os profissionais de diversas áreas que acompanham os alunos durante o ano.
Desde 2017, quando conheceu o programa, Almir Silva, 49, diretor de sucesso da empresa americana de softwares Salesforce, já foi mentor de três estudantes.

Interessado em trabalho voluntário, Almir atuou na arrecadação de alimentos e no auxílio a pessoas em situação de rua até conhecer o projeto do Semear e se identificar com a trajetória —ele conta que também veio de uma realidade de baixa renda.

Almir Silva, 49, que é mentor no Instituto Semear
Almir Silva, 49, que é mentor no Instituto Semear - Bruno Santos/Folhapress

A experiência de mentoria permite compartilhar experiências de vida e carreira para além da cobrança do ambiente de trabalho, afirma.

"A mentoria com cada jovem foi diferente. O primeiro desafio é se colocar no lugar do outro, identificar o que ele tem em mente e, com organização e experiência, ajudar a direcioná-lo."

Como os jovens do Semear são, muitas vezes, os primeiros da família a cursar uma graduação, conversar sobre a carreira é importante para não se sentirem sozinhos, diz Lucas, do Semear.

Ele afirma que a missão do instituto não é perpetuar uma narrativa de meritocracia ou que romantiza as dificuldades encontradas pelos jovens de baixa renda ao cursar uma universidade, mas mostrar que a educação é um caminho possível, importante para a construção da cidadania e que pode contribuir com a formação de novos líderes.

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