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Afro Presença: permanência nas universidades é tema no 1º dia de evento

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Imagem: iStock

Carmen Lucia

colaboração para Ecoa, do Rio de Janeiro (RJ)

09/09/2021 06h00

Educação de qualidade acessível a todos, principalmente a população negra. Este foi o tema que embasou a primeira mesa de debates do Afro Presença, encontro virtual idealizado e coordenado pelo MPT (Ministério Público do Trabalho) e realizado pelo Pacto Global da ONU (Organização das Nações Unidas), na tarde desta quarta-feira (8). A ação é transmitida por Ecoa entre os dias 8 e 10 de setembro, e busca pensar formas de valorizar a diversidade racial nos espaços empresariais.

A discussão inicial girou em torno da educação no Brasil. O professor Pedro Jaime ressaltou a importância da inclusão racial nas universidades de elite públicas e privadas. Segundo ele, o ensino superior no Brasil está reproduzindo o modelo de instituições francesas, que são locais que formam profissionais de elite e, por isso, precisam contribuir com a inclusão racial.

"É necessário conversar com ativistas dentro e fora das universidades, pois isso ajudará na inserção dessas juventudes nas universidades. As políticas públicas precisam conectar o ensino universitário com os lugares de elite. Comparando a inserção no mercado profissional no Brasil com os EUA, precisaríamos ter oito vezes mais profissionais negros no mercado de trabalho aqui para ficar equilibrado".

Mas, além de permitir o acesso ao ensino de nível superior, também é necessário criar ações para ajudar os alunos a permanecerem na universidade. "Com a pandemia, a cada três negros que entrou na universidade, 60 já saíram, porque o Estado não garante a bolsa moradia, a bolsa alimentação, que é reparação por todo o tempo de escravidão. Os europeus tiveram casa, tiveram acesso à terra e a tudo, e nada foi oferecido para a população negra que basicamente construiu este país", avalia Frei Davi dos Santos, CEO do Educafro, espaço que luta pela inclusão de negros, em especial, pobres em geral, nas universidades públicas ou particulares com bolsa de estudos, para possibilitar empoderamento e mobilidade social para população pobre e afro-brasileira.

O negacionismo com relação ao racismo também foi um tema abordado durante o encontro. Elisabete Aparecida Pinto, professora e mediadora do Afro Presença, ressaltou que em um momento de extremo conservadorismo, muitos retrocessos podem acontecer.

"Quando a gente relaciona esse poder partidário com o ensino, têm deputados que são contra as cotas, tem alguns que são favoráveis. Deveria ser uma política de proteção. Na universidade federal sendo um país com dimensões continentais, em alguns estados, pessoas que tinham acesso apenas ao bolsa família, tiveram oportunidades de estudar em universidades públicas, se formar e garantir um futuro melhor".

Para o professor Fernando Conceição, a única forma de uma pessoa negra ter autonomia é por meio da qualificação. "No Brasil, os negros são descapitalizados o tempo inteiro. Isso o torna dependente. Na minha opinião, o negro precisa ter autonomia e isso só é possível quando ele tem qualificação, acesso ao conhecimento".

Inclusão no mercado de trabalho

Outro pronto debatido no dia foi sobre como as instituições de ensino superior podem auxiliar seus alunos a se colocar no mercado de trabalho e permanecer nele. Os convidados refletiram e pontuaram ações de inserção e permanência no espaço de trabalho para conseguir construir uma carreira de sucesso.

Fernanda Lira Goes, técnica em Planejamento e Pesquisa do IPEA, fez uma análise sobre a universidade ser o pontapé inicial para direcionar os alunos ao mercado de trabalho e, assim, os ajudarem a conquistar sua independência. "Por outro lado, as pessoas negras, em sua maioria, estão em alto índice de desemprego, subemprego e sujeitas a vários tipos de violência. Como este painel visa discutir as desigualdades, eu pergunto: 'Quais os impactos percebidos no mercado de trabalho a partir da crescente presença negra nas universidades?'"

Elisa Lucas Rodrigues, da Coordenação da Promoção da Igualdade Racial, da Secretaria de Segurança do Estado de São Paulo, afirma que apesar de aumentar o número de pessoas negras nas universidades, no mercado de trabalho há dificuldade de inclusão, muitas vezes por preconceito. "Recebemos muitos currículos, e as dificuldades são imensas, desde a exigência de inglês fluente, já é um desafio fazer curso superior. Mas as exigências do mercado pedem isso. É importante que a faculdade traga pessoas que falem sobre o mercado de trabalho, ensinem a fazer currículos, ofereça treinamentos, promova visitas às empresas, entre outros", opina.

Já o professor José Jorge respondeu sobre incluir pessoas negras nas oportunidades do mercado de trabalho como contribuição ao desenvolvimento social do país. Segundo ele, há luta no mercado de trabalho e há luta nas universidades. "É importante ter uma visão integrada da situação para maximizar esse momento de articulação entre os dois. A universidade está preparando para o mercado de trabalho e o mercado de trabalho intensifica o retorno às universidades. Nos Estados Unidos, as empresas para serem contratadas pelo estado tinham que ter ações afirmativas. Nós fomos a linha do estado, com autonomia das universidades. O efeito disso puxou bastante negros para o mercado de trabalho".

Ao responder sobre o que é possível esperar ao longo dos próximos anos a partir de políticas que contribuam tanto para a permanecia do negro nas universidades, quanto no mercado de trabalho, Fernanda afirma: "É interessante que a gente coloque como é a questão da entrada de negros e negras no mercado de trabalho, sobretudo nos espaços públicos. A participação das pessoas negras em órgãos públicos, às vezes não é possível porque há órgãos públicos que não tem concurso, portanto, não amplia a entrada dessas pessoas. Alguns que terceirizam, acabam ficando com a maior presença branca. Não temos a presença de pessoas negras nos espaços de liderança e chefia. É fundamental colocar essas pessoas para tomarem decisões nesses espaços".