Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A vez da educação básica

Experiência bem-sucedida da futura equipe do MEC no Ceará indica intenção de privilegiar o ensino básico. Já não era sem tempo, pois sem crianças bem formadas não há progresso

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
3 min de leitura

O ex-governador do Ceará e senador eleito Camilo Santana (PT) será anunciado como ministro da Educação do futuro governo de Lula da Silva. A atual governadora cearense, Izolda Cela (sem partido), que também estava cotada para o cargo, comandará a Secretaria de Educação Básica. Com a nomeação de ambos, a ideia parece ser a de levar para o Ministério da Educação (MEC) a bem-sucedida experiência cearense na área do ensino básico. Se a intenção se traduzir em medidas práticas, será um passo dado na direção certa, considerando que o Ceará é referência nacional na alfabetização de crianças e na melhoria dos índices de aprendizagem.

Este jornal defende que se priorize a educação básica, pois sem crianças bem formadas, na idade certa, não se constituem cidadãos capazes de participar do desenvolvimento nem da vida política do País. De nada adianta construir dezenas de universidades federais nem colocar “a filha da empregada” e “o filho do pedreiro” no ensino superior, como os petistas se jactam de ter feito, se esses mesmos estudantes, por não terem tido formação básica adequada, terão imensas dificuldades para concluir o curso a contento e para desempenhar sua profissão em sua plenitude. Ou seja, não se constrói a casa do desenvolvimento do País começando pelo teto.

A educação básica está sendo negligenciada há muito tempo – decerto porque, entre outras razões, crianças não votam. O resultado disso é claríssimo nas avaliações oficiais. Como registramos aqui há poucos dias (ver o editorial O País reprovado em matemática, 19/12/2022), apenas 5% dos concluintes do ensino médio em escolas públicas demonstraram níveis adequados de aprendizagem de matemática em 2021, no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) do MEC. Vale dizer que esses índices são similares aos registrados em 2019 e 2017, isto é, antes da pandemia de covid-19. Portanto, o problema é estrutural.

Não são apenas os testes de larga escala que retratam índices baixíssimos de aprendizagem. Essa também é uma percepção generalizada no setor produtivo. Diante da escassez de mão de obra qualificada, empresas acabam assumindo para si a tarefa de formar seus trabalhadores, quando não são obrigadas a recorrer à mão de obra estrangeira.

Mudar a realidade educacional, portanto, é tarefa urgente. Da futura equipe do MEC, espera-se a priorização de ações que já tenham se mostrado efetivas em Estados e municípios, caso do ensino em tempo integral. O País dispõe de um bom repertório de iniciativas locais que devem ser ampliadas. Tome-se, a propósito, o caso do Ceará: o apoio que a rede estadual presta às prefeituras, no tocante à formação de professores, à avaliação dos alunos e à produção de material didático, é um bom exemplo de como deve ser o pacto federativo. Parece ser uma boa ideia replicar essa lógica a partir do MEC, estabelecendo uma rede de cooperação técnica com Estados e municípios.

Priorizar a educação básica não implica deixar de lado o ensino superior, como podem sugerir visões mais apressadas. Todos têm a ganhar com a melhoria da aprendizagem de crianças e adolescentes. De um lado, as universidades formam os professores de ensino fundamental e médio; de outro, as escolas de educação básica preparam os futuros universitários.

Que ninguém se iluda, porém. Vários governos, de diferentes agendas ideológicas, prometeram priorizar a educação básica nos últimos tempos. O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, venceu a eleição em 2018 garantindo que o País daria “um salto de qualidade na educação, com ênfase na infantil, básica e técnica”. A petista Dilma Rousseff começou seu segundo mandato, em 2015, sob o slogan “Brasil, Pátria Educadora”, garantindo que haveria acesso universal “à educação de qualidade em todos os níveis, da creche à pós-graduação”. Como se sabe, pouco disso saiu do terreno das boas intenções.

Para piorar, a inoperância do MEC sob Bolsonaro criou uma espécie de armadilha: de tão ruim, qualquer avanço que a futura equipe conseguir já deixará a sensação de dever cumprido. Tremendo equívoco. Na educação, não bastarão “revogaços” nem boas intenções. O País precisa investir pesadamente na educação básica, e já.