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Brasil

A três meses do Enem, educadores criam novas formas de preparação para o exame

Pandemia prejudicou planejamento das escolas; para especialistas, maior desafio imposto pelo ensino a distância é manter atenção dos alunos
Professor de Química do colégio Inovar Veiga de Almeida, Pedro Gabriel criou avaliação pelo Tik Tok para envolver alunos, mas não abandona formas antigas da preparação, como os simulados Foto: Pedro Teixeira
Professor de Química do colégio Inovar Veiga de Almeida, Pedro Gabriel criou avaliação pelo Tik Tok para envolver alunos, mas não abandona formas antigas da preparação, como os simulados Foto: Pedro Teixeira

RIO — O Enem 2020 será singular. Com os colégios abrindo as portas gradualmente, a preparação dos alunos será feita majoritariamente a distância e, mesmo nos mais importantes colégios do país, sem planejamento adequado — afinal, foi impossível antecipar a pandemia. Nesse cenário, escolas e cursos pré-vestibulares correm para inventar novas estratégias para o exame, cuja primeira prova será aplicada em 17 de janeiro, a menos de 90 dias.

— Esse Enem será muito prejudicado — analisa Claudia Costin, diretora do Centro de Políticas Educacionais da FGV/RJ. — Lógico que houve um esforço enorme de professores e das redes para garantir alguma forma de aprendizagem remota. Mas, com o enorme período longe das salas, há uma completa desconexão da escola. Adolescente não tem disciplina para aprender sozinho. Fica tudo muito difícil.

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Neste novo cenário, pré-vestibulares comunitários tiveram que encontrar formas de acesso à internet para seus alunos, escolas precisaram rever modelos de preparação consolidados há anos e até unidades internacionais de ponta procuraram ajuda.

— Essa geração superconectada se adapta facilmente. Foi mais complicado para o professor — avalia André Vieira, 28 anos, que dá aulas de História no pré-vestibular Núcleo Independente Comunitário de Aprendizagem (Nica), no Jacarezinho, Zona Norte do Rio. — Nas aulas on-line, a gente tem que solicitar a participação do aluno, pedir para ouvir a voz dele. É um jeito de mantê-lo atento, o que no presencial você consegue com outros recursos.

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No Nica, os 30 alunos receberam chips de telefone de uma campanha chamada 4G para Estudar, liderada pela ONG Nossas. A rede de ativistas conseguiu arrecadar R$ 600 mil, o que possibilitou a compra de três meses de internet para 4.625 alunos de 31 cursinhos populares espalhados por 10 estados do Brasil.

— Os alunos de escolas privadas têm acesso a coisas que eu não tenho, e a disparidade aumentou com a pandemia. Pelo menos aqui onde eu moro, eles não pararam de estudar quase nenhum dia e até aumentaram a carga horária. Minha escola só voltou nessa semana, com aulas remotas — conta Alane Costa, 17 anos, que só não largou os estudos porque seguiu as aulas da Casa Educação Popular, pré-vestibular de Altamira, no Pará, com chip doado pela campanha da Nossas.

Escolas se readequam

Algumas plataformas digitais também abriram opções para compensar as escolas fechadas. Em parceria com o site Gokursos e o pré-vestibular Vai Cair no Enem, o Ser Educacional, grupo de instituições de ensino superior, criou o Enem 360.

O projeto oferece 100 mil vagas gratuitas para quem deseja se preparar para o exame. O material oferecido tem mais de 300 vídeos, 50 apostilas e aulões virtuais todos os sábados. Para participar, os interessados precisam acessar o site gokursos.com e realizar o cadastro. O conteúdo é liberado de forma imediata.

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Colégios, já acostumados com uma série de metodologias para a preparação do Enem, também precisaram mudar. No Inovar Veiga de Almeida, do Rio, o professor de Química Pedro Ricardo Gabriel criou até uma avaliação usando o aplicativo de vídeos Tik Tok, febre entre adolescentes— justamente para cativá-los. Já as lives viraram rotina, com atividades interdisciplinares, semelhantes às questões do Enem.

— Apesar das mudanças, algumas estratégias do passado permanecem. Elas só mudaram de plataformas, como os simulados, que são corrigidos com o TRI — diz Gabriel, citando a Teoria de Resposta ao Ritmo, algoritmo usado pelo Enem para corrigir e dar nota às questões da prova.

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Assim como a Inovar Veiga de Almeida, o colégio Elite, da rede Eleva, também contratou uma plataforma de aulas e exercícios on-line para uso de seus estudantes. Além disso, o planejamento foi reformulado para priorizar alguns conteúdos.

— Mais do que nunca, os aprovados serão os que focaram em seus propósitos. Os que, apesar dos diferentes senões, se organizaram. E isso significa passar horas e horas estudando. Esses vão passar na prova— avalia Caroline Lucena, coordenadora do Ensino Médio e do Pré-vestibular do Elite, que abriu, no começo do mês, um preparatório intensivo para alunos ainda interessados em começar a preparação on-line.

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Em São Paulo, o Avenues, um dos colégios mais caros do país, também buscou uma preparação especial para o Enem. A escola, inaugurada em 2018 com um modelo internacional de ensino que segue o calendário do Hemisfério Norte, recebeu metodologias específicas da rede Poliedro para uma plataforma toda on-line dedicada aos alunos que se interessam pelo Exame Nacional do Ensino Médio — no Avenues, a maioria se prepara para as universidades americanas.

— O Poliedro tem mais experiência em uma aplicação contínua de simulados com a classificação dos alunos e a avaliação das habilidades mais vulneráveis — afirma Cristine Conforti, diretora do programa brasileiro da Avenues — Além disso, os nossos professores preparam material suplementar com o nosso estilo, que preza a interdisciplinaridade.