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'A pobreza menstrual contribui para a iniquidade de gênero', diz especialista sobre a importância de projeto aprovado em SP

Iniciativa irá distribuir absorventes em escolas públicas do estado; coordenadora de coletivo ressalta que questão é de saúde pública
Coordenadora de coletivo celebra distribuição de absorventes gratuíta em SP Foto: Unsplash
Coordenadora de coletivo celebra distribuição de absorventes gratuíta em SP Foto: Unsplash

O governo de São Paulo divulgou nesta quarta-feira, 23, que o programa Dignidade Íntima se tornará uma ação permanente no estado. Criado para distribuir absorventes para as alunas da rede pública de ensino, a iniciativa receberá repasse de R$ 35 milhões para os produtos de higiene íntima feminina. De acordo com a coordenadora do coletivo Igualdade Menstrual Andressa Carmo, a medida é essencial visto que as meninas passam de três a sete anos da vida escolar menstruando.

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- É importante que o ensino público tenha em mente que é preciso garantir segurança menstrual para quem está ali. A pobreza menstrual contribui inclusive para a iniquidade de gênero – diz a especialista.

Dados divulgados pela UNICEF revelam que uma em cada quatro meninas deixa de ir à escola por não ter uma forma apropriada de conter o fluxo. A coordenadora do coletivo ressalta que, cinco dias de aula perdidos por mês – tempo médio de um ciclo – acarreta 25% de falta no final do ano letivo.

- Elas perdem conteúdo, não conseguem acompanhar e isso acaba gerando uma evasão escolar. Ter uma lei que possa garantir essa distribuição gratuita também garante que as meninas continuem indo para a escola – explica Andressa Carmo.

Pobreza menstrual

A coordenadora ressalta que a pobreza menstrual é um problema multidimensional. Em relação às pessoas que vivem em estado de extrema vulnerabilidade, as necessidades femininas não ficam em primeiro plano. Por isso, mulheres passam a improvisar com papelão, miolo de pão, sacola ou pedaços de tecido.

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- É um problema de saúde pública porque uma mulher pode morrer vítima de uma infecção generalizada – diz.

No ano passado, o coletivo Igualdade Menstrual fez uma pesquisa via formulários on-line e constatou que 34% das mulheres não tinham informação sobre os ciclos quando ficaram menstruadas pela primeira vez. Para a surpresa de Andressa, muitas tinham mestrado e doutorado. Em relação à necessidade de combate, ela diz que a lei pode ser um primeiro passo.

- Muitas mulheres acham absurdo o estado ter que prover absorventes. O governo precisa dar absorvente sim, para vivermos de forma plena. Quando vamos na câmara municipal (de Curitiba) e falamos de menstruação, só falta os representantes se esconderem embaixo da mesa – conta.

Igualdade Menstrual em 2022

Neste ano, o objetivo do coletivo curitibano também está na educação pública. A partir de parcerias, a organização arrecadou cinquenta mil absorventes para serem entregues nas escolas estaduais e municipais do município. Andressa Carmo explica que a entrega é acompanhada de uma roda de conversa com uma equipe multidisciplinar.

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- A ideia é emponderar não só o corpo docente, mas toda a instituição. Nossa equipe conta com o apoio de uma psicóloga, educadores, uma médica ginecologista e uma bióloga especialista em educação menstrual.

Por fim, a coordenadora ressalta que a maior dificuldade do coletivo é fazer as pessoas entenderem que pobreza menstrual é um problema sério. Nesse contexto, ela relembra um episódio em que sofreram preconceito dentro do ativismo social.

- Entramos em contato com uma organização que ia fazer uma ação bem grande de doação em uma comunidade aqui em Curitiba. Perguntamos quantas mulheres iriam receber cesta básica e responderam que ninguém precisa de absorvente, mas de arroz, feijão e óleo – finaliza.

Sobre a lei sancionada

O programa Dignidade Íntima foi instituído em 2021 para combater a pobreza menstrual e a evasão escolar, a partir da distribuição de produtos de higiene íntima para alunas de todas as unidades escolares da rede estadual.

Em fevereiro deste ano, o projeto de lei para tornar a iniciativa permanente foi encaminhado à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e foi aprovado no dia 15 de março.

- É um programa que atende inicialmente meninas jovens, a partir de 13 anos, em alta vulnerabilidade, de famílias que estão em situação de pobreza ou extrema pobreza, e que não tinham o acesso ao absorvente íntimo – disse o governador João Doria (PSDB).