Antônio Gois
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Antônio Gois

Um espaço para debater educação

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Antônio Gois

Jornalista de educação desde 1996. Autor dos livros 'O Ponto a Que Chegamos'; 'Quatro Décadas de Gestão Educacional no Brasil' e 'Líderes na Escola'.


Na semana passada, uma nota técnica do movimento Todos Pela Educação mostrou que, apesar dos avanços em todos os grupos, jovens negros (considerando a soma dos autodeclarados pretos e pardos no IBGE) continuavam uma década atrasados em relação aos brancos em indicadores como a taxa de frequência ao ensino médio ou de conclusão desta etapa.

Entre 2012 e 2022, o percentual de jovens brancos que concluíram o ensino médio até os 19 anos de idade aumentou de 62% para 75%. Entre pretos, a variação foi de 32% a 61% e, entre pardos, de 43% para 62%. Ou seja, apesar de terem melhorado, os indicadores de 2022 da população negra neste recorte são iguais aos dos brancos dez anos antes.

A desigualdade racial é aquela de raízes mais profundas na sociedade brasileira. Há duas semanas, citei um artigo dos pesquisadores Julia Walter e Thomas Kang, publicado no Observatório da Produtividade Regis Bonelli (FGV). Ao analisarem uma base de dados educacionais que começa em 1925 e vai até 2015, os autores mostram que a distância entre negros e brancos, em termos de escolaridade média da população adulta, ficou praticamente inalterada em 90 anos.

É uma dinâmica diferente, por exemplo, da desigualdade de gênero no mesmo indicador, que começou em favor dos homens a partir do primeiro ano da série (1925), mas que, a partir de 1983, se inverte e amplia a favor das mulheres. Por várias razões, essa “vantagem” feminina em escolaridade média ainda não levou ao fim da desigualdade no mercado de trabalho, mas o ponto aqui é identificar que o movimento, ao menos na educação, é distinto do verificado pelo recorte racial.

No passado, um dos principais fatores a explicar a desigualdade racial na educação era o fato de negros terem menor acesso à escola. No entanto, ao menos desde o início deste século, já estamos muito próximos de 100% da população com 6 ou 7 anos de idade estudando. Mas, uma vez matriculados no sistema educacional, as trajetórias são distintas, como mostra um artigo – também já citado aqui – dos pesquisadores José Francisco Soares, José Aguinaldo Fonseca e Maria Teresa Gonzaga Alves.

Analisando o período entre 2007 e 2015, os autores mostram que meninas brancas de famílias de alto nível socioeconômico tinham 78% de chances de completar o ensino fundamental sem nenhuma repetência ou evasão. Já entre meninos pretos de menor nível socioeconômico, este percentual é de apenas 20%.

Além do desafio da permanência de todos até o fim da educação básica, temos ainda o problema da qualidade. Dados do Anuário Brasileiro da Educação Básica de 2021 (Editora Moderna/Todos Pela Educação) mostram que 18% dos jovens brancos concluíam o ensino médio com aprendizado adequado em matemática. É um percentual já muito insatisfatório, mas ainda menor entre pardos (7%) e pretos (5%).

Nos tempos atuais, é preciso lembrar o óbvio: essas diferenças não são causadas por mérito, inteligência ou esforço pessoal. São fruto de séculos de desigualdade, persistente até hoje. Para combatê-la precisaríamos de um choque de equidade no sistema, oferecendo desde a primeira infância às crianças que mais precisam – considerando a injusta desigualdade herdada de berço – as melhores oportunidades educacionais. Infelizmente, seguimos fazendo o oposto.

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