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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|A PEC da Transição e seus riscos

Aprovar a proposta sem prover antecipadamente recursos para isso tem tudo para amontoar distorções na economia brasileira

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Foto do author Celso Ming
Atualização:

A PEC da Transição está sendo decidida no escuro, na base do “tem de ser porque tem de ser, o resto a gente vê depois”.

Trata-se de pedido de permissão para abrir mais um furo no teto de gastos, desta vez de quase R$ 200 bilhões, que não se limitará a 2023, mas a cada ano, até 2026. Mas não há ideia de como será equacionada a responsabilidade fiscal.

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Em princípio, nada de errado em garantir o Bolsa Família, que parece ser o início da perenização da proposta de Renda Mínima, o mantra do hoje vereador Eduardo Suplicy. Mas adotar esse procedimento sem prover antecipadamente recursos para isso tem tudo para amontoar distorções. Uma delas consiste em deixar contratadas novas emissões de moeda ou disparadas da dívida pública – e do dólar. Se for por aí, ainda em 2023 o Banco Central será obrigado a empurrar os juros para cima, numa conjuntura global de recessão e, portanto, de puxada nos freios do crescimento também por aqui. Recessão ou avanço mais baixo do Produto Interno Bruto (PIB) implica redução da arrecadação e, portanto, buraco aberto para mais déficit.

A estas alturas, não se sabe ainda quais pedaços do corpo ficarão de fora do cobertor. Por enquanto, sabe-se que o Bolsa Família, a merenda escolar, o financiamento das creches e a Farmácia Popular não têm cobertura orçamentária.

Ainda há a necessidade de reajustar a tabela progressiva do Imposto de Renda; os Estados, por exemplo, vêm perdendo quase R$ 30 bilhões com o subsídio aos combustíveis fósseis e clamam pela derrubada desses subsídios – algo que faz sentido à luz da necessidade de apressar a transição energética para os combustíveis renováveis. Sabe-se lá o que mais ainda aparecerá em ânsia de verbas. Enfim, o jeitão é o de que o céu é o limite dos gastos. De PEC em PEC, de furo em furo, não tem mais o que furar, como cantaria Adoniran Barbosa.

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Geraldo Alckmin entrega anteprojeto de PEC da Transição para o presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Wilton Junior/Estadão

Embora o presidente Lula tenha dito e repetido que o teto de gastos não funciona e tem de ser revogado, ele continua lá, desmoralizado, mas lá, à espera de outra âncora para que não sobrevenha a dominância fiscal, que é o nome técnico dado para descontrole geral.

Parece inevitável a aprovação dessa nova PEC. Ao longo dos trâmites poderá ser reduzido o valor total, que já não é de R$ 150 bilhões nem de R$ 175 bilhões, mas de R$ 198 bilhões, número quebrado que parece disponível para uma tesourada. Os congressistas poderão também encurtar a validade da autorização dos gastos extras para apenas um ano, em vez de quatro, como vem sugerindo o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

Outro foco da escuridão mencionada na abertura deste texto é a falta de uma reforma tributária. O problema é que todas as pressões juntas para dar conta das despesas poderão conjurar por uma reforma tributária que não se limitará à racionalização do sistema, mas que aumentará substancialmente a carga tributária.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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