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A educação básica e o novo governo paulista

Observa-se neste início o mesmo e pouco eficiente gerencialismo de décadas

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Márcia Jacomini

Doutora em educação (USP), é professora do Departamento de Educação da Unifesp

No dia 16 de março, o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) anunciou o sistema Aluno Digital, como parte do programa Sala do Futuro. Também apresentou a Prova Paulista, a ser realizada bimestralmente, por meio digital. A ideia é oferecer informações rápidas às escolas sobre presença e desempenho dos estudantes.

Anunciadas como novidade, essas medidas reforçam o gerencialismo que impera na rede desde os anos 1990 e que não resolveu os principais problemas do ensino paulista.

O governador, Tarcísio de Freitas, e o secretário de Educação, Renato Feder
O secretário da Educação de São Paulo, Renato Feder, e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) - Flávio Florido/Seduc-SP - Flávio Florido/Seduc-SP

A pesquisa Política Educacional na Rede Estadual Paulista (1995-2018), disponível em repu.com.br e financiada pela Fapesp, indica que carecem de atenção o direito à educação (acesso e qualidade), a gestão democrática e a valorização de profissionais da educação.

No período, houve redução de 2,9 milhões de matrículas na rede. A maior parte se deve à municipalização do ensino fundamental, mas chama a atenção a queda de matrículas no ensino médio, sobretudo após a emenda constitucional 59/2019, que tornou obrigatória a educação escolar de 4 a 17 anos. Quanto à população de 15 a 17 anos, havia um déficit de 180 mil matrículas em 2018 —maior no ensino noturno.

O Programa Ensino Integral (PEI) contribuiu, assim, para excluir jovens trabalhadores ao não prover um auxílio-permanência que lhes garantiria o estudo nesta condição. Assim, o estado mais rico do país priva pessoas pobres de direitos, obrigando-as a recorrer ao Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), cuja busca aumentou de 2017 a 2019.

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) revela que o estado está distante da Meta 7 do Plano Estadual de Educação 2016-2026, cuja projeção para 2021 era 6,7, 6,1 e 5,4 para os anos iniciais e finais do ensino fundamental, e o ensino médio, visto que em 2019 eram 6,6, 5,2 e 4,3, respectivamente.

Quanto ao Índice de Desenvolvimento da Educação (Idesp), seu crescimento anual de 2007 a 2018 mostra que a meta projetada pelo governo para 2030, de 7, 6 e 5 para os anos iniciais e finais dos ensinos fundamental e médio, só seria realizada em 2023, 2041 e 2032, respectivamente. A Prova Paulista, que substituirá o Saresp, promoverá a aprendizagem? As avaliações externas têm sido influências positivas? Se os dados parecem mostrar que não, por que insistir na mesma política?

Por que a Secretaria da Educação, findo o período de governos do PSDB, não muda a política de gestão da rede e das escolas e melhora as condições de trabalho dos profissionais da educação?

No período estudado, a política de educação foi pautada pelo gerencialismo. A gestão democrática foi preterida e só em 2016, após ocupações de escolas em 2015, a secretaria propôs um projeto —que nem sequer foi enviado à Assembleia Legislativa— para regular o princípio constitucional.

Prevaleceu a visão de que apenas organizações e fundações da sociedade civil —Instituto Ayrton Senna, Associação Parceiros da Educação, Fundação Itaú Cultural, Fundação Lemann, Todos pela Educação, Instituto de Corresponsabilidade pela Educação, entre outras— estão habilitadas para discutir e propor políticas educacionais.

A desvalorização de pessoal foi tão grande que em vários anos o governo teve de pagar abonos para que a remuneração de parcela docente respeitasse o piso salarial da categoria (lei 11.738/2008). A maioria encontrava-se nos níveis iniciais da carreira em 2018, face às dificuldades para movimentação. Com isso, em 2022, a rede deixou 22% de disciplinas do novo ensino médio sem docentes e, no segundo semestre, contratou pessoal sem devida formação para docência. A manutenção da nova carreira, cuja maioria dos efetivos não aderiu, contraria uma política de valorização docente.

Em síntese, nas últimas três décadas vigoraram na educação básica paulista interesses do capital em detrimento dos direitos da população. O atual secretário da Educação, Renato Feder, manterá os mesmos princípios e políticas? Se for essa a opção, a situação indicada pela pesquisa poderá ser ainda pior daqui a quatro anos.

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